Mercado financeiro

Selic não é São Pedro

No último mês, reli um livro chamado “Sem Esforço” do autor Greg McKeown, o mesmo autor do famoso livro “Essencialismo”. Muitas vezes na vida, nós somos levados a acreditar que os resultados são alcançados com base em muito esforço. Mas neste livro, o autor fala que “esforçar-se além da conta torna mais difícil obter o resultado que se quer.”

Em inglês, existe uma expressão bem famosa sobre o isso. “Work smarter, not harder”. Trabalhe estrategicamente, não duramente. Como a economia se relaciona com vários aspectos da nossa vida, essa leitura me fez lembrar do momento atual. Será então que estamos acreditando que a forma de corrigir uma inflação deve ser sempre da forma mais dura?

O dragão da inflação

Aliás, vale saber que a inflação corrói o nosso poder de compra. Ver as coisas ficarem mais caras é ruim para o orçamento das famílias e das empresas. É algo, portanto, que precisa ser combatido.

Vivenciamos longos períodos do Banco Central usando a Selic alta (adequadamente, diga-se de passagem) para conter as expectativas de inflação. Digamos que a atitude “Selic alta” é a forma “alto esforço” do Banco Central para lidar com a inflação.

Quando o Banco Central aumenta a taxa de juros, ele estimula que as taxas cobradas por empréstimos bancários também subam. Afinal, a Selic é a taxa básica de juros para o restante da economia. Isso diminui o volume de empréstimos a pessoas e empresas, desestimulando, então, o consumo das pessoas e o investimento em novos negócios. Por isso a inflação abaixa.

Entretanto, isso pode levar alguns a acreditarem que a taxa Selic deve sempre estar presente em qualquer situação inflacionária.

Quando usar e quando não usar?

Vale relembrarmos o cenário. O retorno às atividades após a pandemia, a situação geopolítica e as incertezas sobre a reforma tributária de um novo governo, na época, aumentavam as expectativas sobre uma inflação alta no futuro.

Uma taxa de juros alta, então, sinalizava que o Banco Central estava altamente comprometido com o combate da inflação. Independente de eleição, cenário político ou interferências, o sinal que o Banco Central passa é que o dragão precisa ser domado com rédea curta.

Depois deste remédio amargo e um BC irredutível, as famílias e empresas passam a acreditar que a inflação, no futuro, estará mais baixa. Consequentemente, os preços definidos hoje já tendem a aumentar menos.

A falta ou excesso das chuvas podem prejudicar o plantio de algumas culturas, desequilibrando momentaneamente a relação oferta e demanda.

Mas isso não muda as expectativas. Os preços sim sobem. Mas sabemos que é uma situação que se resolve quando a situação climática retorna ao padrão. Recentemente, a Aneel sinalizou um aumento no custo da energia, acionando a bandeira vermelha patamar 2 para setembro.

É correto pensar que, com energia mais cara, naturalmente aumentará o custo de produção na indústria e que aumentará o custo de moradia das famílias. Isto é o que chamamos de choque de custos.

Os reservatórios das hidrelétricas estarem cerca de 50% abaixo da média é ruim, mas a meteorologia é capaz de prever sinais. Não deixa incerta a expectativa para o futuro. Sabemos que, tão breve se normalize a situação das chuvas, o preço da energia voltará ao patamar padrão.

Conforme o próprio Banco Central, “quando as expectativas sobre o futuro são menos incertas, estes choques de custos na economia tendem a se propagar de forma mais limitada na economia, reduzindo seus efeitos inflacionários”. Dias depois do anúncio de bandeira vermelha, a Aneel já reviu para “menos pior do que imaginávamos”.

Portanto, meu recado é: calma. A taxa Selic para controle de inflação é uma medida agressiva. Não é e nem deve ser banalizada. Deixemos as chuvas com São Pedro.

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