Finanças

momento da virada já começou, diz CEO

Empresas citadas na reportagem:

Sim, você leu certo o título deste texto: 95% dos lares brasileiros têm pelo menos um par de chinelos da marca Havaianas, que pertence à Alpargatas. Quem contou isso para o Visão de Líder foi o CEO da companhia, Liel Miranda. Só para se ter uma ideia, cerca d 33 milhões de brasileiros não têm acesso à água potável, segundo levantamento do Instituto Trata Brasil. Isso dá cerca de 84% da população. Ou seja: numa comparação grotesca, mas que faz a gente parar para pensar, existem mais brasileiros usando chinelo da Alpargatas (ALPA4) do que com acesso à água. Mas veja, não estamos levando em conta que uma pessoa pode ter mais de um par. Mesmo assim, a conta vale para que a gente tenha dimensão do poder da marca.

Marca esta que tem 1.000 lojas, 600 no Brasil (mas está presente mais de 300 mil pontos-de-vendas e 400 no exterior, como Estados Unidos, França, Inglaterra, Espanha, Filipinas, Indonésia, Tailândia.

A Havaianas pertence à Alpargatas, cujo valor de mercado é de cerca de R$ 5,5 bilhões. São 8.000 funcionários. E, na ponta desta companhia está o administrador de empresas Liel Miranda

Liel tem 30 anos de experiência como executivo e é presidente da Alpargatas desde fevereiro de 2024.

Antes, ele foi presidente da Mondelez, que é dona de marcas famosas como Oreo, Milka, Toblerone, Tang, Halls.

E, antes ainda, trabalhou na Souza Cruz por 27 anos, e foi presidente da empresa por 3.

A entrevista com Liel Miranda você acompanha no vídeo acima, ou nos principais trechos abaixo:

Por que a Alpargatas reduziu o número de marcas?

Nós estamos na Europa, Estados Unidos e até na Ásia. Então, somos uma marca global. Até pouco tempo atrás, a gente tinha outras marcas fortes, como a Osklen, Dupé, Mizuno. Hoje temos duas marcas: Havaianas e Rothy’s, que fabrica sapatos a partir de garrafas PET recicladas. A gente tomou uma decisão estratégica há alguns anos, de que focaria em calçados. Mas nosso foco de negócio hoje está na Havaianas.

Com a marca e a marca Havaianas, ela tem muita força, ela tem muito apelo. Ela é uma marca querida, é a marca que não pertence à Alpargatas, pertence aos brasileiros. Então, a gente tem outros produtos que acompanham a marca Havaianas, principalmente produtos que fazem parte do kit de praia, como camisetas e acessórios.

Em que momento a Havaianas está agora?

Eu acho que a Havaianas teve dois momentos. O primeiro foi durante a pandemia, em que as pessoas em casa deixaram de ir para o escritório, para as escolas e passaram a usar Havaianas e roupas mais confortáveis. Então, a gente teve um crescimento de volume significativo naquele período e depois da pandemia, principalmente os anos de 2022, 2023.

E aí, vimos o reverso de tudo isso, com todo mundo voltando aos escritórios. Foi aí que as nossas vendas caíram e tivemos que fazer uma uma mudança estratégica. A empresa tinha tomado a decisão durante os anos iniciais da pandemia de diversificação em geografias. Então a gente começou a expandir exportação para muitos países. A gente lançou muitos produtos, sempre com a marca Havaianas.

E a gente também tomou a decisão de diversificar os canais de vendas, com forte presença no meio digital. Então, a gente teve uma revisão estratégica que tem a ver com foco na Havaianas, que é onde a gente lidera.

Posso dizer que, desde então, a gente saiu da crise. Hoje a empresa está entregando resultados. O nosso EBITDA está crescendo, nós temos um caixa positivo, o volume de vendas é maior, temos mais participação de mercado. A crise ficou para trás.

Por que o nível de entrega dos produtos para o varejo era tão baixo?

Há muita complexidade no processo da Alpargatas, desde a matéria-prima que até a logística. Então, a causa desse baixo atendimento foi a complexidade. E como resolvemos isso? A primeira coisa foi reduzindo a complexidade. A gente cortou de 2023 para 2024 metade dos modelos e cores que a gente vende.

Então, hoje em dia o consumidor chega na loja a chance dele encontrar o número que ele quer e na cor que ele quer é muito maior, porque não tem tantas variações. E a grande prova que isso deu certo é que a gente cortou 50% dos modelos e das cores e a gente não perdeu venda. A gente cresceu em volume. Então, na verdade, o consumidor não queria tudo aquilo, a gente que tinha criado uma complexidade desnecessária.

Como eliminar a complexidade de uma operação?

A Alpargatas cortou no portfólio, focou em 15 mercados e hoje a gente está trabalhando muito melhor. A segunda coisa é investir em tecnologia, porque grande parte disso vem dos seus sistemas de planejamento, de distribuição, de logística.

Quando tudo é automatizado, do pedido até a entrega, a chance de erro é muito menor. Hoje, a gente está focado no consumidor, e menos nas fábricas.

O dólar, porque muitas matérias-primas são importadas. Quando o dólar sobe, impacta o custo e a gente não pode repassar o custo do dólar porque o bolso do consumidor não é dolarizada. A segunda coisa é o petróleo. E o petróleo afeta tudo, porque ele afeta o custo do frete. Então, no final das contas, a gente sempre tem que gerenciar essas pressões de custo.

E o terceiro é mão de obra. Nós temos quase 8.000 pessoas nas nossas fábricas e, obviamente, com aumento de custo de salário ou de custo, ou seja, de impostos, impacta o custo da produção.

Entre 2021 e agora, a cotação de ALPA4 caiu de R$ 60 para cerca de R$ 6. Haverá uma retomada dos preços?

O que houve foi um pico nos preços em agosto de 2021. Eu não poderia dizer se o preço das ações da Alpargatas volta a R$ 60. Então, na verdade, a ação da Alpargatas não caiu simplesmente. Ela subiu muito no período que coincide com a pandemia. O volume estava crescendo, a empresa estava expandindo para outros mercados, outros segmentos, outras categorias.

A gente teve uma redução de custos muito grandes em 2023 e a gente tem mantido esses custos sob controle. Então, apesar de inflação, apesar de dólar, apesar de aumento de petróleo e matéria-prima, a gente manteve os nossos custos sob controle.

Então acho que o mercado vai começar a ver que uma empresa que consegue crescer volume e faturamento, consegue manter os custos sob controle. A empresa vale cada vez mais.

Quem investe em ações da Alpargatas?

A Alpargatas é uma empresa icônica. Das empresas que estão listadas na bolsa brasileira hoje, a Alpargatas, é a mais antiga. Então, ela está na cesta do investidor brasileiro.

Ela não é uma blue chip, porque ela não está entre as maiores empresas do mercado, mas é icônica. Muita gente investe na Alpargatas. Não tem um perfil específico de investidor.

Mas podemos dizer que ele está investindo pelo longo prazo, porque ele pode começar a ver que todos os trimestres a gente consegue demonstrar que o faturamento cresce, o custo está sob controle. E isso não é uma coisa que vai fazer uma ação explodir, mas também é um de perfil de empresa que vai ser consistentemente bem gerenciada e entregar os resultados.

A primeira coisa é que a Havaianas evoluiu muito desde que Chico Anísio era nosso garoto-propaganda, com as suas Havaianas legítimas, que eram azul e branca. Este é um case do marketing brasileiro. A empresa foi muito inteligente, as pessoas que estavam aqui na época de capturar aquela tendência e lançar toda uma linha colorida. E desde então o Havaianas deixou de ser um produto funcional que você compra para ter uma utilidade e passou a ser um item de moda.

Hoje a gente consegue atender o consumidor desde uma Havaianas de R$ 30 para ir na praia, até talvez uma Havaianas de R$ 360, que é mais um item de luxo do que propriamente um um chinelo funcional.

Então, hoje Havaianas tem esse poder e talvez isso é o que faz a marca tão poderosa. Ela é absolutamente democrática.

É mais fácil vender chocolate ou chinelo?

Eu diria que, com uma marca como a Havaianas, é muito fácil vender. Eu tenho visitado muitos clientes desde que eu assumi a Alpargatas. Tem um pouco de reclamação, mas demora dez minutos. E aí os outros 45 minutos da conversa é sobre parcerias com a marca.

Como conseguir ser CEO de 3 empresas de diferentes áreas?

Eu não tenho a receita, porque eu acho que tem uma combinação de estar na hora certa, no lugar certo e ser a pessoa certa para aquela oportunidade. Mas eu tive muita sorte de estar numa empresa, a Souza Cruz, que desenvolvia talento. E eu fui usando essas oportunidades ou me beneficiando delas e subindo na carreira.

Então, acho que é uma combinação, você precisa estar no lugar certo. E ter certeza que aquela empresa que você quer estar e que vai te levar para onde for a sua ambição não necessariamente precisa ser levada a presidente.

Trabalhar em uma empresa de capital aberto é mais difícil?

Eu nunca tinha trabalhado em uma empresa de capital aberto, porque tanto a Souza Cruz quanto a Mondelez são subsidiárias de uma multinacional. Então, essa foi uma grande motivação para eu vir trabalhar aqui. E o que a Alpargatas estava buscando era alguém que já tivesse experiência como presidente de empresa, que foco e que dominasse todo o processo, desde a matéria-prima até o ponto-de-venda.

Não acho que ser CEO de uma empresa de capital aberto seja mais difícil. A companhia só tem outros aspectos, outros desafios. Quando você está numa empresa como a Alpargatas, tudo começa e acaba aqui. Não é uma empresa matricial, não tem um alguém em algum lugar do mundo pensando nas inovações do futuro, não tem alguém em algum lugar do mundo pensando em inteligência artificial

Que tipo de investidor você é?

Sou um investidor moderado, não invisto em coisas muito arriscadas, até porque todo o meu patrimônio foi feito do trabalho. Então, eu sei quanto me custou ganhar cada real. Eu evito investimentos em que eu tenha grandes oportunidades, mas também grandes riscos.

Então, por exemplo, eu não invisto em criptomoeda porque eu acho muito volátil. Eu acho que para alguém como eu, que não tenho tempo, eu evito esse tipo de investimento.

E ter inteligência financeira é você se conhecer. À medida em que você se conhece, você sabe qual é a sua ambição.

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