Mercado financeiro

Lula, o pacote de corte de gastos e a confiança dos investidores

O BTG Pactual divulgou na terça-feira (19) relatório para avaliar o ‘Desafio Central no Brasil do Lula III’. Assim, no documento o time de analistas do banco destaca que os ativos de risco brasileiros se deterioraram significativamente nos últimos meses. Sobretudo com a confiança dos investidores na sustentabilidade do arcabouço fiscal e da trajetória da dívida do país atingindo mínimas de vários anos.

“Apesar das boas intenções do ministro da Fazenda (Fernando Haddad) e dos esforços para implementar cortes de gastos necessários, parece haver falta de apoio político (sólido) para medidas mais estruturais. Os preços dos ativos estão caindo para níveis reminiscentes da era Dilma (com taxas reais das NTN-B de 10 anos se aproximando de 7%), embora ainda haja alguma distância”, apontam os especialistas do BTG.

“As diferenças hoje incluem dinâmicas de crescimento, o papel do BNDES e a governança das estatais. Mas o mercado continua monotemático: 100% focado em preocupações fiscais. Dado o elevado nível de dívida e o potencial de aceleração no ritmo de deterioração fiscal, vemos o cenário como binário. Ou os formuladores de políticas entregam o mínimo necessário para estabilizar o sentimento, ou estamos caminhando para outra decepção”, afirmam.

Dívida alta do governo preocupa

Nesse sentido, o relatório do BTG menciona que a principal preocupação dos investidores é o alto nível inicial de dívida do Brasil. Conforme o time de analistas do banco, Lula herdou uma dívida bruta de 72% do PIB. Em comparação com os 53% de Dilma Rousseff. Bem como aprovou medidas que aumentaram significativamente os gastos no início de seu mandato (+1,7% do PIB).

“Com esse indicador, o mercado está preocupado com a trajetória da dívida, com economistas projetando que a dívida/PIB chegue a cerca de 84% ao final do mandato de Lula. Isso é significativo, pois implica uma expansão de 12 p.p. na dívida durante o mandato. Colocando o Brasil acima de pares como México (50%), Chile (~40%), Colômbia (54%) e Turquia (30%)”, comentam os especialistas.

“Sustentar uma dívida bruta superior a 80% com taxas reais próximas a 7% é desafiador, com o déficit nominal possivelmente ultrapassando 8% do PIB. Resultando em um prêmio de risco elevado. Até que o governo enfrente o problema da dívida e implemente medidas para desacelerar esse crescimento (de preferência cortes de gastos), os preços dos ativos devem continuar refletindo altos prêmios de risco”, acrescentam.

Lula III melhor que a era Dilma

Adiante, o relatório do BTG anota que a economia apresenta fundamentos um pouco mais fortes hoje. Segundo os analistas, graças a reformas recentes (“como a Trabalhista de Temer em 2017”) e, mais recentemente, devido ao impulso fiscal atual (longe do ideal).

Então, na visão deles, com o crescimento do PIB próximo de 3%, a deterioração da dívida ocorre de forma mais lenta, e a saúde corporativa está consideravelmente mais forte desta vez. Isso embora o momento atual possa não ser sustentável em 2025, dado o potencial de condições financeiras mais restritivas.

“A inflação também apresenta diferenças notáveis: no governo Dilma, a inflação ultrapassou 10%, enquanto atualmente está na faixa de 4,5-5%. Apesar de 4,7% ser muito distante da meta de 3%, é difícil argumentar que a inflação esteja completamente fora de controle nesses níveis”, avaliam os especialistas.

“Métricas implícitas de inflação rondam 6% (diferença entre DI de longo prazo e NTN-Bs), refletindo preocupações fiscais e uma economia aquecida. O saldo comercial do Brasil também está em melhor forma, com superávit acima de US$ 70 bilhões, uma melhora substancial em relação aos pequenos superávits da era Dilma”, prosseguem.

BNDES, Petrobras, BB e Caixa

Ainda no relatório, o BTG observa que o papel do BNDES é significativamente menor, o que é um fato positivo. Conforme o documento do banco, as concessões de crédito do BNDES nos últimos 12 meses representam cerca de 1% do PIB, com empréstimos totais equivalentes a 4,5% do PIB, Ou seja, abaixo dos níveis de picos de ~4% e ~10% durante o governo Dilma.

“Isso reflete um mercado de capitais mais saudável e um papel reduzido do BNDES nos últimos anos. As estatais também estão em uma posição mais forte, beneficiando-se de melhorias institucionais (ex: Lei das Estatais).

“Além disso, o endividamento é menor (ex: Petrobras com alavancagem de apenas 0,9x, contra mais de 4x anteriormente) e a rentabilidade é significativamente maior (ex: Banco do Brasil e Caixa gerando lucros substancialmente superiores).”

Foco total no corte de gastos

Por fim, o time de analistas do BTG avalia que o governo Lula tem atualmente uma oportunidade de recuperar a confiança dos investidores. Caso, na opinião deles, consiga implementar cortes de gastos significativos nos próximos dias.

“O mercado precisa ver a sustentabilidade do arcabouço fiscal atual e um crescimento mais lento dos gastos. Com os investidores acreditando que um teto de gastos de 2,5% será respeitado e que a trajetória da dívida se estabilizará em breve, com superávits primários alcançados nos próximos anos (um desafio político considerável)”, apontam os especialistas.

” Enquanto o mercado de ações permanece barato e os lucros das empresas superaram as expectativas, os investidores precisam que os formuladores de políticas estabilizem o sentimento do mercado. Caso isso não aconteça, outra queda do mercado de ações é provável, com inflação e juros subindo e a economia enfrentando uma desaceleração significativa (implicando que os níveis atuais de lucros não são sustentáveis)”, completam os profissionais do BTG.

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