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Brasil costura acordos às vésperas de cúpula do G20

A uma semana da cúpula de chefes de Estado do G20, grupo de 19 dos países mais ricos do mundo além de União Europeia e União Africana, o Brasil tem o desafio de acomodar interesses antagônicos na declaração de todos os participantes ao fim dos dois dias de encontro.

Além disso, somam-se ao perfil do grupo conflitos internacionais e a eleição de Donald Trump.

Para especialistas, o resultado da corrida à Casa Branca pode esvaziar a agenda brasileira na presidência do G20, especialmente no combate às mudanças climáticas.

O Brasil herdou da Índia o comando do grupo e escolheu três grandes temas para o período à frente do fórum de cooperação internacional: combate à fome, à pobreza e à desigualdade; desenvolvimento sustentável; e reforma da governança global.

A passagem de bastão do comando rotativo, agora para a África do Sul, será em 1º de dezembro.

Enquanto isso, a reunião de mais alto nível, que acontecerá no Rio de Janeiro, é o ápice de um ano de negociações.

G20: Brasil conseguiu superar impasses em negociações

Em mais de 130 reuniões técnicas e ministeriais no Brasil e nos EUA, a diplomacia brasileira conquistou avanços, como os primeiros consensos ministeriais desde o início da guerra da Ucrânia, em fevereiro de 2022.

Assim, a estratégia de deixar o debate sobre conflitos geopolíticos para os chefes de Estado abriu caminho para a aprovação de 41 comunicados.

Dentre eles estão as dos ministros de finanças, de desenvolvimento e do grupo de transição energética.

A pesquisadora do Brics Policy Center e professora da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Ana Saggioro Garcia, elogiou a capacidade do Brasil de liderar consensos na atual conjuntura externa de acirramento de tensões.

Dessa forma, mesmo sem avanços em medidas mais concretas, até agora, ela destaca a inclusão da desigualdade no centro da agenda do G20.

“A presidência brasileira tem o mérito de colocar o tema das desigualdades e das questões sociais no centro da agenda do G20”, disse ela.

Negociadores do Ministério das Relações Exteriores avaliam que os acordos nos grupos temáticos vão ajudar a destravar o texto final.

Ainda é preciso definir, no entanto, quais trechos serão incluídos no documento, que teve 37 páginas na presidência indiana.

Brasil conseguiu alinhar agendas das frentes de trabalho no G20

O G20 é dividido em duas frentes de trabalho: as trilhas de sherpas e de finanças.

A de sherpas tem supervisão de enviados dos chefes de Estado, responsáveis por acompanhar as negociações e discutir as principais pautas.

Já a de finanças trata de temas econômicos e é comandada por líderes dos ministérios da economia e presidentes de bancos centrais.

Uma inovação da presidência brasileira foi integrar as trilhas e criar forças-tarefas de ambas para turbinar os principais objetivos, como a Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza.

Portanto, a iniciativa é vista como a principal marca brasileira à frente do G20.

O Brasil superou a divisão entre as trilhas de sherpas e de finanças e misturou as duas trilhas. Nada da trilha dos sherpas funciona sem as finanças.

Não se resolve questões de clima e de combate à fome sem financiamento ou tributação”, afirma o professor em relações internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC) Giorgio Romano Schutte.

G20: Desafio é evitar que guerras contaminem negociações

Até agora, diz ele, o Brasil tem conseguido evitar o contágio de questões geopolíticas como a guerra da Ucrânia e o conflito em Gaza na negociação do G20.

“Vamos ver se consegue blindar até o fim. Seria algo que poderia até impedir um comunicado final.”

A linguagem da declaração sobre os conflitos geopolíticos terá discussões até o último minuto.

Consequentemente, se as guerras ficaram fora das declarações ministeriais, agora será inevitável encerrar o impasse e encontrar um denominador comum sobre o tema.

O debate vai dominar o último encontro dos sherpas do G20, também no Rio, ao longo desta semana.

Assim, o objetivo é chegar a um ajuste fino sobre palavras que não comprometam o entendimento sobre a guerra na Ucrânia e os conflitos no Oriente Médio.

“O máximo possível será alguma declaração genérica no sentido de trabalhar pela paz mundial e tentar se chegar a uma solução pacífica, mas nada que aponte um dedo para os culpados porque tomar um lado fatalmente divide os países do G20”, diz Maurício Santoro, cientista político e colaborador do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Marinha.

Sobretudo, um dos destaques na presidência brasileira foi a agenda ambiental.

“O Brasil é um ator demasiadamente importante na questão ambiental e essa marca ficou clara no G20”, diz o coordenador do Centro Internacional de Políticas para o Desenvolvimento Inclusivo (IPCid) do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), André de Mello e Souza.

Eleição de Trump enfraquece pauta brasileira no G20?

Coordenador da organização The Bretton Woods Project, o economista Luiz Vieira destaca ainda os resultados na área tributária, com consenso entre ministros de finanças sobre a taxação dos super-ricos.

Porém, ele não vê o mesmo avanço sobre reformas estruturais de organizações multilaterais.

“É uma área na qual o processo será mais difícil e devagar, porque o G20 não é responsável pela gestão de instituições multilaterais”, diz.

“Após três presidências de países do Sul Global [Indonésia, Índia e Brasil], não foi possível progredir em reformas da arquitetura internacional.

Enquanto isso, a eleição de Trump tende a enfraquecer as propostas brasileiras à frente do G20.

Os negociadores brasileiros, porém, sustentam que a eleição americana terá pouco impacto, porque as negociações aconteceram no governo de Joe Biden.

“A cúpula vai ocorrer em contexto em que o presidente americano é como um pato manco, sem legitimidade para grandes decisões”, diz Santoro sobre Biden.

Para Schutte, da UFABC, o ideal seria que uma equipe de Trump também participasse do encontro.

“Mas não considero isso provável pela visão dele do multilateralismo. A probabilidade de Trump incorporar ideias do G20 em sua gestão é próxima a zero”.

Por fim, Schutte vê a cúpula como oportunidade para o Brasil na arena internacional, mesmo com entraves e eventuais retrocessos do G20 no futuro.

Com informações do Valor Econômico

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