Banco Central está preocupado com bets, diz Campos Neto
O Banco Central vem acompanhando o volume financeiro enviado por brasileiros a sites de apostas esportivas, as chamadas bets, desde janeiro. A afirmação é do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e foi feita nesta quinta-feira (26). O resultado é “preocupante”.
O principal alerta do BC é a respeito do volume financeiro médio dos brasileiros gasto em sites de aposta, afirma Campos Neto. “Entre janeiro e agosto, o ticket médio de aposta em bets via Pix cresceu rapidamente até os R$ 100”. O número foi divulgado em relatório do BC enviado em resposta a ofício do senador Omar Aziz (PSD/AM).
Bets podem impactar inadimplência no Bolsa Família
Em divulgação do relatório de inflação nesta quinta-feira (26), Campos Neto disse que vê o volume transferido para bets como “relevante”.
No documento enviado a Aziz, o BC apontou que cinco milhões de beneficiários do principal programa de transferência de renda do governo repassaram R$ 3 bilhões a sites de aposta em agosto.
No total, brasileiros pagaram R$ 20,8 bilhões.
A “relevância” também vale para beneficiários do Bolsa Família.
“Por que o BC olha coisas desse tipo? Por que são relevantes para o canal de crédito e inadimplência”, disse o presidente da autarquia.
A preocupação, portanto, não se limita ao volume movido pela indústria das bets. O BC acredita que as apostas podem ter impacto negativo no endividamento do brasileiro, especialmente o de baixa renda.
A rapidez de crescimento nas transferência via Pix para esse tipo de plataforma acendeu o alerta na instituição.
“O volume crescia muito rápido. Começamos a ficar preocupados também com volumes de transferências muitos grandes. Para debate interno, queríamos calcular quais eram os valores de curto prazo”, relatou Campos Neto.
Assim, o presidente do BC explicou que o estudo divulgado nesta semana cruzou informações de diferentes bancos de dados para chegar aos resultados.
A maioria dos pagamentos e transferências para bets é feita hoje pelo Pix, mecanismo desenvolvido pelo próprio BC.
Transferências de cartão de crédito para sites de aposta, por outro lado, correspondem entre 10% a 15% do total, ainda de acordo com o presidente do BC.
Há, contudo, uma parcela que o Banco Central não conseguiu monitorar, de pagamento via carteiras digitais.
Então, são operações que “nem sempre o emissor do cartão, no momento do pagamento, consegue identificar a compra feita na ponta”, pondera Campos Neto.
Pistas sobre o futuro da Selic
Além das bets, o Banco Central revelou no relatório trimestral de inflação números que afastam ainda mais o IPCA da meta da autarquia, de 3% para 2025 e 2026.
A inflação acumulada em 12 meses voltou a subir em agosto, saindo de 3,93% para 4,24%. Os principais núcleos do IPCA seguiram a mesma trajetória.
Assim, o Banco Central reafirmou o compromisso de baixar a inflação em direção à meta. “A inflação segue desancorada. É essencial trazer a inflação para meta ao menor custo possível”, disse o diretor de política monetária do BC, Diogo Guillen.
Na quarta-feira (25), o IPCA-15, contudo, mostrou uma prévia de inflação abaixo da projetada pelo mercado. Ao analisar o indicador, Campos Neto reconheceu melhora dos subgrupos do IPCA, mas o que “não significa que o ciclo (de alta de juros) não deveria ter iniciado”.
Dessa maneira, Guillen destacou o chamado hiato do produto, capacidade de a economia do Brasil crescer acima do potencial, como “importante” na análise da dinâmica da inflação.
“Expectativas de inflação melhoraram, mas depois pioraram na ponta. Fizemos projeção de mudança relevante no hiato, decidimos iniciar o ciclo por aumento de assimetria de riscos altistas”, comentou.
Assim, o hiato do produto corrente para 2024 deixou o campo neutro desde o começo do ano e subiu para a banda de 0,5%. O fator também é um risco de alta para a inflação, e foi considerado na decisão de aumentar a Selic na última quarta-feira.
No horizonte relevante da política monetária olhado pelo BC, 2026, o hiato projetado é de -0,3%.