A impossibilidade de estimar a adoção do Bitcoin
A adoção do Bitcoin é um tema recorrente, frequentemente tratado como um processo homogêneo. No entanto, na realidade, não existe uma única adoção do Bitcoin, mas sim várias adoções distintas, ocorrendo de formas diferentes.
Estimar a adoção do Bitcoin não é tarefa simples. Isso acontece em parte pelas características da rede, mas também por conta de uma questão mais simples: não há consenso sobre o que significa “adotar” o Bitcoin, e diferentes grupos de usuários utilizam definições distintas para esse conceito.
O que é adotar o Bitcoin?
De forma geral, adotar o Bitcoin refere-se ao ato de começar a usar o Bitcoin de alguma forma. Essa “forma” pode variar amplamente dependendo do contexto, incluindo:
- Poupança: Utilizar o Bitcoin como uma forma de preservar capital ao longo do tempo.
- Meio de pagamento: Usar o Bitcoin para realizar compras do dia a dia.
- Transações sem intermediários: Remessas internacionais são um ótimo exemplo de como os intermediários estão sendo tornados obsoletos.
- Rede descentralizada de troca de informações: Compartilhamento de arquivos de texto e imagens.
- Mineração: Utilizar eletricidade para a mineração de Bitcoin.
Além disso, surge a questão de qual tipo de alocação deve ser considerada como adoção. Por exemplo, investidores com 1% alocado em Bitcoin via um ETF devem ser considerados? O Bitcoin custodiado por terceiros, como exchanges, deve ser incluído? Ou apenas um usuário avançado que faz a própria custódia de suas chaves privadas e roda o próprio nó é alguém que já adotou o Bitcoin?
Mesmo que um usuário rode seu próprio nó, se ele tiver “apenas” 20% ou “apenas” 50% de seu patrimônio líquido em Bitcoin, ele adotou o Bitcoin? Não há consenso, e diferentes pessoas terão definições variadas do que significa “adoção”.
A adoção do Bitcoin não é um processo singular, mas uma miríade de processos distintos, cada um contribuindo para a expansão e evolução dessa tecnologia financeira revolucionária.
As Diferentes Curvas de Adoção do Bitcoin
O debate entre os Bitcoiners frequentemente gira em torno do uso correto do Bitcoin: como moeda para transações diárias (meio de pagamento) ou como poupança (reserva de valor), uma maneira segura de economizar dinheiro a longo prazo.
Alguns argumentam que o Bitcoin é impróprio para pequenas compras, como um café na padaria, enquanto outros, que o veem como poupança, preferem não utilizá-lo para transações diárias, focando em armazená-lo a longo prazo. Há ainda aqueles que o consideram um investimento, atraídos pela assimetria entre risco e retorno.
A adoção de tecnologias é um processo caótico e variado, e isso se aplica ao Bitcoin. Pessoas diferentes adotam o Bitcoin por motivos distintos: como moeda (meio de troca), como poupança (reserva de valor) ou como investimento.
Essas curvas de adoção ocorrem simultaneamente, interagem e se retroalimentam. A realidade não segue modelos teóricos rígidos; a adoção do Bitcoin como reserva de valor não precisa preceder seu uso como meio de troca.
No entanto, a adoção como reserva de valor tem predominado, corroborando modelos teóricos e mostrando que, apesar de múltiplas motivações, a reserva de valor é a função principal para a maioria dos usuários.
Além disso, o surgimento dos ordinals, inscriptions, tokens BRC-20 e runas adicionaram uma nova dinâmica, permitindo o uso do Bitcoin como banco de dados descentralizado.
A Impossibilidade de Calcular a Adoção
Mesmo que exista um consenso sobre o que significa adotar o bitcoin, a realidade é que, diferente do que ocorre com outras tecnologias, é extremamente difícil, provavelmente impossível, metrificar a adoção do bitcoin com precisão. Existem diversas métricas que podem ser utilizadas para esse fim, mas todas elas possuem suas falhas intrínsecas.
Uma das métricas mais utilizadas é o número de novos endereços criados. Em um primeiro momento, essa até pode parecer uma métrica boa métrica, mas ela sempre tem que ser vista dentro do contexto de que um usuário pode criar inúmeros endereços. Quantos? É extremamente difícil de se estimar.
Enquanto usuários experientes podem usar um endereço novo a cada transação, diversos usuários nunca sacaram seus bitcoins das exchanges e nem são contabilizados por esta métrica.
Um exemplo prático: nos primeiros dias do bitcoin, Satoshi sabe com certeza que ele é o único a utilizar a rede.
No dia seguinte, ele envia alguns bitcoins para o Hal Finney. Ele sabe que existem 3 endereços que podem ser observados na Timechain: 1) o original dele, 2) o que recebeu os sats (Hal) e 3) agora um novo endereço com a taxa de transação e a remuneração do bloco. O primeiro problema que fica evidente é como estimar quantos endereços de troco são na verdade endereços de troco e não mais uma transação com um novo adotante.
Digamos que, hipoteticamente, no seguinte dia Hal Finney resolveu testar o protocolo e criou uma (ou duas, ou cinco) assinaturas novas e enviou bitcoins para si mesmo. O segundo problema é que endereços podem ser criados a custo zero por uma pessoa. No terceiro dia, alguém que estivesse contando apenas os endereços para medir a adoção já estaria com uma métrica míope.
Em outras palavras, podemos ter “apenas” 6 milhões de usuários, cada um com 1000 endereços, o que já seriam 6 bilhões de endereços utilizados e poderia passar a impressão de uma adoção massiva.
Outro ponto é que número de endereços não significa adoção monetária. Por exemplo, podemos ter um endereço para cada indivíduo no mundo, mas se eles colocarem apenas 1 centavo em satoshis cada, a adoção é pequena.
Ainda existem boas práticas como a consolidação de endereços, a mistura de moedas e o uso da rede lightning que ainda complexifica ainda mais a possibilidade de se relacionar o número de endereços com a adoção por novos usuários. Uma parcela significativa dos usuários de bitcoin também ainda não faz sua própria custódia e deixa suas moedas nas exchanges.
Assumindo que estes bitcoins das exchanges de fato existam (o que não é uma certeza e, muito provavelmente, existe paper bitcoin em pelo menos algumas exchanges, como no caso da FTX) e que estas pessoas representam adoção (o que depende das definições de adoção, muitos consideram que somente quem faz sua própria custódia realmente adotou o bitcoin), este é mais uma incógnita inmetrificável. Nesses casos, a posse do bitcoin é atribuída à exchange ou ao serviço de custódia, dificultando a determinação da verdadeira adoção individual.
O bitcoin também pode ser usado offline em transações peer-to-peer, onde não há registro na Timechain. Essas transações não são rastreáveis e não são incluídas nas estatísticas públicas sobre a adoção do bitcoin.
Em suma, é impossível saber de fato o que o número de endereços utilizando a rede bitcoin realmente significa. Como não existe uma forma precisa de se calcular a adoção, muitos recorrem à estimativas baseadas em dados onchain, estimativas baseadas em relatórios de exchanges, número de downloads de wallets ou de vendas do livro “Padrão Bitcoin”. O único fator comum entre todas estimativas é que todas elas possuem uma grande margem de erro.
Embora seja difícil calcular a adoção do bitcoin de forma precisa, estimativas podem ser feitas com base em dados disponíveis, como transações na Timechain, volumes de negociação em exchanges, número de carteiras criadas e outras métricas relacionadas. No entanto, é importante reconhecer as limitações e incertezas envolvidas nessas estimativas
Indiretamente, sabemos que está acontecendo adoção. O valor de mercado do Bitcoin só aumenta e cada vez mais empresas estão envolvidas no ecossistema. Os eventos nacionais são cada vez maiores e mais frequentes e existe muito mais conteúdo de qualidade que no ciclo passado.
No fim das contas, acompanhar esses números e a buscar cravar um número preciso não é relevante. O que realmente importa é que a adoção é tão baixa que uma ordem de magnitude não faz diferença – se temos 0.01% ou 0.001% de adoção global – ainda existe muito espaço para crescimento. Basicamente: não conseguimos acertar os números precisamente, mas sabemos que ainda é cedo e que a tendência é de alta.