Imprimir dinheiro resolve a pobreza?
Imprimir dinheiro pode resolver o problema da pobreza? Essa é a discussão da vez no X, antigo Twitter. Embora não seja um questionamento novo, o tema ganhou destaque recentemente por meio de uma publicação que viralizou. Uma usuária da rede sugeriu que a impressão de dinheiro seria uma alternativa possível para diminuir a distância entre ricos e pobres e resolver problemas econômicos.
Embora a ideia pareça, à primeira vista, uma solução simples, a realidade é bem mais complexa e envolve um conceito importante: o de inflação. Mas antes, é válido saber que os participantes do X não são os primeiros (e certamente não serão os últimos) a discutir o tema.
Pensadores e economistas defendem essa “solução”?
Sim, alguns pensadores e economistas defendem a impressão de dinheiro como uma solução para combater a pobreza, embora essa ideia seja amplamente contestada.
Entre os que sugerem algo nessa linha estão os proponentes da Teoria Monetária Moderna (do inglês, Modern Monetary Theory, ou MMT). A MMT argumenta que, em uma economia com moeda soberana, o governo pode imprimir dinheiro para financiar projetos de interesse público, como programas de transferência de renda, saúde e educação, sem se preocupar imediatamente com déficits.
A economista americana Stephanie Kelton é uma das vozes mais proeminentes da MMT, argumentando que o governo não precisa cortar gastos ou aumentar impostos antes de gastar mais, desde que a inflação esteja sob controle.
Segundo essa teoria, a impressão de dinheiro só se torna um problema quando causa inflação, mas a MMT defende que o governo pode gerenciar isso por meio de políticas fiscais e tributárias.
Por outro lado, críticos da MMT alertam que imprimir dinheiro excessivamente pode levar à hiperinflação, como já aconteceu em países como Zimbábue, Venezuela e Brasil.
Esse tipo de política pode ter efeitos negativos de longo prazo, corroendo o poder de compra e aumentando desigualdades.
Então, embora existam defensores dessa ideia, ela continua controversa no meio econômico.
A planejadora financeira Andressa Siqueira traz uma explicação prática de como a inflação funciona, usando a metáfora de um hambúrguer.
“Imagina que você vai comprar um hambúrguer na lanchonete. A quantidade de pão, carne, cebola, ketchup, e até de funcionários, continua a mesma. Mas, de repente, todo mundo tem o dobro de dinheiro. O que acontece? Mais pessoas vão querer comprar os mesmos lanches. O dono da lanchonete, então, vai aumentar o preço.”
Esse cenário ilustra bem como a inflação surge: o dinheiro em circulação aumenta, mas a oferta de bens e serviços permanece a mesma.
O resultado é uma escalada nos preços, que reduz o poder de compra da população. Portanto, imprimir dinheiro para resolver a pobreza não é uma solução viável.
“Para que a economia funcione de forma saudável, precisa haver um equilíbrio entre a quantidade de dinheiro, a produção de bens e a oferta de serviços.”
Os efeitos desiguais da inflação
Outro ponto importante que Andressa destaca é que a inflação afeta as pessoas de maneiras diferentes.
“Normalmente, os super ricos não sentem tanto os efeitos da inflação. Eles continuam consumindo bens, enquanto os mais pobres sentem cada centavo a mais nos preços”, ela afirma. À medida que os preços sobem, os mais vulneráveis enfrentam uma perda significativa em seu poder de compra.
A inflação, portanto, não é apenas um fenômeno de aumento de preços.
“As empresas também ficam com medo de investir, o que reduz a produção e o emprego, agravando ainda mais a situação”, completa Andressa. Esse ciclo de dificuldades afeta tanto os negócios quanto as famílias, resultando em uma economia desorganizada.
Como controlar a inflação
O combate à inflação, como explica Andressa, não é algo que se resolve com um “aperto de botão”.
“As políticas econômicas levam tempo para surtir efeito, e várias medidas precisam ser ativadas para fazer esse controle”, ela diz. Um exemplo comum é o aumento da taxa de juros pelo Banco Central. “Quando os juros sobem, os empréstimos ficam mais caros e o consumo tende a diminuir, o que ajuda a controlar os preços”, ressalta a planejadora.
Além disso, é crucial que a oferta de bens e serviços acompanhe o crescimento da quantidade de dinheiro em circulação.
Ou seja, é preciso estimular a produção e o crescimento econômico de maneira equilibrada, para que o mercado não sofra os efeitos de uma demanda maior que a oferta.
Inflação e gastos públicos
Uma questão que também tem ganhado destaque nos últimos anos é o papel dos gastos públicos no controle da inflação. “Se o governo gasta demais, isso pode gerar inflação ao aumentar a quantidade de dinheiro em circulação”, diz Andressa.
Nesse sentido, uma das medidas discutidas é a redução dos gastos públicos, buscando um equilíbrio que não afete diretamente as camadas mais vulneráveis da população. “É igual ao orçamento de casa: não dá para sair gastando sem controle. O mesmo vale para o governo,” completa a planejadora financeira.
O meme e a realidade
O meme que sugere imprimir dinheiro para resolver a pobreza e “criminalizar a inflação” pode ser divertido à primeira vista, mas também destaca uma frustração real: as dificuldades que as pessoas enfrentam em tempos de inflação alta.
Embora o meme ofereça uma solução fictícia, ele reflete um desejo de controle sobre algo que afeta diretamente o bolso dos consumidores.
“A inflação é um sintoma de uma economia desajustada,” ressalta Andressa. “Ela pode ser causada por fatores internos e externos, como crises globais ou aumento no preço de commodities, e por isso precisa ser combatida com uma série de políticas interligadas.”
Portanto, o controle da inflação exige uma visão sistêmica e uma série de medidas integradas, que vão muito além de simplesmente imprimir mais dinheiro.